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  • Eduardo Szklarz

“A dinâmica do crime organizado na América Latina”, Eduardo Salcedo-Albaran en Infosur Hoy


Organizações criminosas com poder descentralizado se dedicam simultaneamente a diversos negócios dentro e fora da lei e buscam controlar territórios.

BUENOS AIRES, Argentina – O crime organizado está sofrendo uma mutação na América Latina.

Analistas de segurança dizem que as organizações estão mais descentralizadas e já não se dedicam a um único negócio, e sim a uma gama de atividades dentro e fora da lei.

“Hoje é difícil falar em ‘cartéis’ porque sua estrutura não é mais piramidal, como a do antigoCartel de Medellín”, diz o especialista em crime organizado Eduardo Salcedo-Albarán, diretor da Fundación Vortex, na Colômbia.

Segundo Salcedo-Albarán, a tendência é a formação de redes transnacionais, que não concentram o poder decisório numa só pessoa.

“Mais difícil ainda é falar em ‘cartel do narcotráfico’, pois redes mexicanas como Los Zetas,Cavaleiros Templários e Sinaloa, também realizam extorsão, sequestro, pirataria, tráfico de pessoas, mineração ilegal e lavagem de dinheiro”, diz Salcedo-Albarán.

Em abril de 2013, por exemplo, a Procuradoria-Geral do México desarticulou uma célula de Los Zetas que roubava combustível de oleodutos da petroleira Pemex, no estado de Hidalgo, para revenda e exportação.

“Há uma evolução das chamadas enterprise syndicates (organizações voltadas aos negócios) para novas estruturas criminosas do tipo power syndicates, que baseiam seu poder no controle do território”, diz Antonio Mazzitelli, representante do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) no México.

É o caso das organizações mexicanas, das maras (gangues) na América Central, doscomandos no Brasil e dos Bacrim (grupos criminosos emergentes) na Colômbia.

“Todos eles não dependem de um só negócio, mas de uma gama de negócios que respondem à dinâmica econômica do território controlado”, completa Mazzitelli.

O território pode ser um bairro, uma favela, um vilarejo ou mesmo partes de uma cidade.

“Primeiro controlam os mercados criminosos (narcotráfico, extorsão, tráfico de pessoas), depois os ilícitos (falsificações, pirataria) e, em alguns casos, os negócios lícitos das empresas”, diz Mazzitelli. “Se no território existe demanda de droga, haverá droga. Se tem rota de migrantes irregulares, haverá migrantes irregulares”.

O passo seguinte é a infiltração em amplos setores da sociedade.

“Quando falamos em crime organizado, tendemos a pensar só em criminosos. Mas as estruturas dessas redes têm uma parte mais complexa: uma zona cinzenta entre o legal e o ilegal”, diz Salcedo. “São empresários, banqueiros e funcionários públicos que fornecem informações e contribuem para que as redes sejam mais bem-sucedidas.”

América Central

O aumento do crime organizado ajudou a fazer da América Central a região mais violenta do mundo.

Em 2013, as maiores taxas de homicídio foram registradas em Honduras (79 por 100.000 habitantes), El Salvador (42) e Guatemala (35), de acordo com Pedro Trujillo, diretor do Instituto de Estudos Políticos e Relações Internacionais da Universidad Francisco Marroquín, na Guatemala.

Trujillo observa um vínculo crescente entre grupos criminosos guatemaltecos e algumas situações de conflito social.

“Quando certos manifestantes bloqueiam rodovias para protestar contra a exploração de recursos naturais, por exemplo, os territórios imobilizados são utilizados para transporte de narcóticos”, diz Trujillo. “Aviões aterrissam em pistas clandestinas para descarregar a droga ou para retirá-la de esconderijos e levá-la à fronteira com o México.”

Alguns protestos ambientais seriam realizados para salvaguardar as zonas controladas por traficantes, segundo Trujillo. O objetivo é dificultar a entrada de forças de segurança nesses territórios.

“No departamento de San Marcos, na fronteira com o México, a companhia elétrica não consegue entrar para consertar os medidores de luz porque é impedida por grupos como a Frente Nacional de Lucha (movimento revolucionário que age em defesa dos serviços públicos e dos recursos naturais), diz ele, lembrando que San Marcos é um dos epicentros do narcotráfico na Guatemala.

O portfólio do crime organizado na América Central também inclui assassinato sob encomenda, lavagem de dinheiro e contrabando de migrantes.

“Grupos sofisticados como Los Zetas já dominam as rotas do narcotráfico. E se você já tem rotas para transportar drogas, pode usá-las para transportar pessoas”, diz o criminologista James Finckenauer, professor emérito da Rutgers University-Newark, nos EUA.

América do Sul

Em toda a América Latina, a formação das redes criminosas ocorre de baixo para cima.

Na fase inicial de operações, dominam o território usando a violência. Depois instauram um poder político local para conseguir certa legitimidade entre os moradores.

“À medida que consolidam o poder no território, as redes se infiltram e cooptam níveis superiores da administração pública para finalmente se integrar aos fluxos transnacionais de atividades como o narcotráfico”, afirma Salcedo-Albarán.

Foi assim com o grupo paramilitar Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC), que a partir do fim dos anos 90 elegeu prefeitos, governadores e congressistas, diz Salcedo-Albarán.

Monopólio do crime

A tendência do crime organizado é formar monopólios, dizem os analistas.

“[No Brasil], o Primeiro Comando da Capital (PCC) está conseguindo o monopólio da venda de armas e drogas”, diz o brasileiro Marcus Reis, especialista em crime organizado e terrorismo. “O PCC já consegue fixar o preço da droga em São Paulo, no Nordeste e no Sul do país.”

A organização seduz novos membros propagando o “laço de familiaridade” que mantém com os detentos dos presídios.

Apesar das disputas com as facções Comando Vermelho e Amigos dos Amigos no Rio de Janeiro, Reis aposta em uma “acomodação” das forças criminosas.

“Esses grupos vão fazer acordos para obter o monopólio brasileiro do valor da droga. Quanto mais concorrentes, pior para eles. É o que acontece no México, onde há várias organizações grandes brigando entre si.”

Nos últimos anos, a maior pressão exercida pelas forças de segurança no México e na Colômbia levou à migração de narcotraficantes a outros países da região.

Muitos vão para a Argentina atraídos pela impunidade, o alto padrão de vida e a infra-estrutura de estradas, portos e aeroportos, segundo os analistas.

Cidades como Rosário, Buenos Aires e Córdoba se tornaram focos da ação de bacrim colombianos e de células dos mexicanos Los Zetas e Sinaloa, que traficam drogas e pessoas para a Europa.

“Estamos perto de ser o novo México”, diz o deputado argentino Gustavo Vera, presidente da Rede Nacional Antimáfia. “Narcotraficantes estão assassinando pessoas em plena luz do dia e atacando meios de comunicação, como foi o caso do jornal El Sol, da província de Mendoza.”

O aumento do consumo de drogas na América do Sul também repercute nos países produtores, como a Bolívia.

“Em 2011, 54% da cocaína apreendida no Brasil provinha da Bolívia, seguida de Peru (38%) e Colômbia (7,5%)”, diz Antonino De Leo, representante do UNODC na Bolívia.

Naquele ano, o governo boliviano identificou o Brasil como principal destino da cocaína confiscada na Bolívia.

“O crime transnacional trabalha como as multinacionais. Vai atuar nos lugares onde a percepção de risco for menor”, diz De Leo. “Quando cresce a pressão num país, o crime busca outras rotas e oportunidades.”

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